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Decisão de Cármen Lúcia de suspender resolução que aumentava limite de coparticipação é correta, segundo Idec e deputado, pois mostra que usuário de planos de saúde está cada vez mais à mercê do mercado

No Brasil de hoje, operadoras de planos de saúde ditam as regras do mercado e cobram o que querem por um leito de hospital

São Paulo – A decisão cautelar da ministra Cármen Lúcia, presidenta do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a Resolução Normativa 433/2018, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que aumentava o limite de coparticipação para 40% ou 60%, dependendo do contrato, entre outras regras, expõe a fragilidade cada vez maior do usuário diante de um sistema controlado pela iniciativa privada, a partir da própria ANS e com apoio do governo Michel Temer.

Por isso, a decisão da ministra é considerada técnica e juridicamente correta tanto pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) como pelo deputado federal Ivan Valente (Psol-SP), membro da Comissão de Defesa do Consumidor (CDC) da Câmara.

“A decisão foi correta porque a Resolução 433, da ANS, é um descalabro”, diz o parlamentar. Ele menciona trecho que considera emblemático de entrevista concedida, na quarta-feira (18), pelo diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS, Rodrigo Aguiar, ao jornal O Globo. “A ANS foi criada para proteger o sistema de saúde suplementar. Obviamente, na nossa regulação, a gente considera a vulnerabilidade do consumidor, mas a gente não é um órgão de defesa do consumidor”, disse o executivo.

“Esses caras, que vêm do setor privado, com uma canetada, decidem sempre a favor do comércio de saúde”, comenta Valente. Ele menciona como exemplos esclarecedores dois nomes indicados recentemente pelo governo Michel Temer para ocuparem cargos de diretoria na ANS, Rogério Scarabel Barbosa e Davidson Tolentino de Almeida.

Em nota quando da indicação de ambos, em maio, o Idec e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) protestaram. “A ANS há muito tempo já está contaminada e capturada pelos interesses do mercado que ela deveria regular”, disseram as entidades.

Elas afirmam que Rogério Scarabel Barbosa, como advogado, defende empresas junto a agências reguladoras, “dentre elas a própria ANS”. Já Tolentino é ligado ao PP e “estaria envolvido em esquema de corrupção na Lava Jato”. O nome de Scarabel já foi aprovado pelo Senado (no mês passado), enquanto o de Tolentino está parado na Comissão de Assuntos Sociais da Casa, sob relatoria do senador Sérgio Petecão (PSD-AC).

“Temos combatido a chamada ‘porta-giratória'”, diz Ivan Valente. “O cara vem da iniciativa privada, teoricamente para regular, fiscalizar e controlar, mas chega lá para fazer o jogo das operadoras.”

Pesquisadora em saúde do Idec, Ana Carolina Navarrete diz que os consumidores e a própria entidade têm motivos para comemorar a decisão de Cármen Lúcia. “É uma decisão acertada. A ministra verificou o perigo de instabilidade e insegurança jurídica, inclusive considerando que os termos da normativa não foram discutidos com as entidades de defesa dos consumidores.” Para ela, a resolução da ANS “é um retrocesso na regulação hoje em vigor”.

Segundo a pesquisadora, inúmeras entidades solicitaram à ANS, sem sucesso, a abertura de consulta pública para discutir temas como o limite entre mensalidade, franquia e coparticipação.

Ana Carolina também considera correta a decisão da presidente do STF ao questionar a competência da ANS para normatizar a questão. A competência, segundo a argumentação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, autora da ação, é do Conselho de Saúde Suplementar (Consu) e do Legislativo.

A Resolução Consu n° 08 estabeleceu “limitações e vedações às operadoras de planos de assistência à saúde no que toca à possibilidade de utilização de franquias e mecanismos de regulação”, anotou a ministra do STF na decisão, mas, segundo ela, ao regular a matéria, a ANS ultrapassou os limites de sua atuação como órgão fiscalizador e usurpou a competência do Executivo e do Legislativo, com a Resolução Normativa n° 433, de 2018.

Para Ivan Valente, um Ministério da Saúde comandado por um governo voltado à cidadania deveria intervir em favor do usuário, ao invés de delegar o sistema de saúde a uma agência reguladora controlada por representantes de empresas privadas. “Se fosse pela posição do Psol, a gente acabaria com as agências reguladoras. Ficaria sob competência do Executivo.”

Segundo pesquisa realizada pela Associação Paulista de Medicina (APM) divulgada nesta quinta-feira (19), 96% dos usuários de planos de saúde fizeram algum tipo de reclamação nos últimos dois anos. Consultas médicas (76%) e exames 72% foram os problemas mais relatados.

Fonte: Rede Brasil Atual.